Uma coisa
sempre me incomodou quando leio a afirmação corrente de que Parmênides e
Heráclito excluem-se um ao outro teoricamente. Os dualismos excludentes ad infinitum são possíveis? Existem? É
possível que esses dualismos deixem de existir numa conciliação que põe fim o
seu caráter excludente? Os contrários na verdade não são opostos, mas
integrados na produção deles próprios alternativamente: a visão de mundo em
mutação dos antigos chineses Admitindo um sim, podemos dizer que se existem
contrários que ainda não atingiram esse outro nível integrador é porque tal fato
não se revelou, manifestou, se desvelou, ou seja, realizou-se como fenômeno.
Até aqui um total palavreado carente de certeza científica, mas com alguma
chance de ter uma serventia: investigar para tentar fazer aflorar o que não
quer se mostrar como evidente. Mais um problema: quando um fenômeno não se
mostra evidente isso ocorre porque simplesmente não existe tal fenômeno, já que
essa é a característica fundamental do fenômeno: mostrar-se.
O tudo é fluxo e o tudo é uno são opostos excludentes? Não há aqui aquela situação na
qual um engendra o outro sucessiva e alternadamente no caminho trilhado pelo
cosmos, ou pelo Tao? O “não ser” (WU) característico do Tao é o oposto da
Pré-sença de Heidegger? O ser e o nada de Sartre? Temos que continuar perguntando:
o logos de Heráclito é o WU ou a pré-sença? Parmênides nega o WU, o nada, o não
ser, de acordo com ele de forma lógica só é possível o ser: se algo existe não
pode ser, ao mesmo tempo, o que não existe. Parmênides conclui que a mudança
não é possível. No entanto, o fato de ter existência não determina a imutabilidade.
O ser pode ser o que existe e ao mesmo tempo caracterizar-se pela mudança
contínua e infinita. Dessa forma: o uno pode
ser puro fluxo.O fluxo do uno
que se mostra, que pode ser descrito, no Taoísmo, não é o verdadeiro caminho.
Esse não se mostra: tem a qualidade do não ser. Para a fenomenologia, no
entanto é o que importa entender, explicar, compreender justamente o
desvelamento do que existe.
O logos divino
de Heráclito pode ser o Deus que tudo observa de Berkeley. O logos divino tudo
governa e o Deus que tudo vê. O que muda entre a opção pelo governar e o ver? O
olhar enquanto manifestação fundamental do cosmos nos leva à postura empirista
inglesa. O governar manifesta a origem política do Taoismo? A visão de mundo em
mutação constante dos chineses é o mesmo tudo é fluxo de Heráclito. A
influência oriental na origem da Filosofia Ocidental é evidente. Enquanto a
filosofia oriental manteve-se praticamente a mesma ao longo do tempo como uma tradição
que não se alterou a filosofia ocidental adentrou-se por meandros diversos com
resultados diversos, ora com hegemonias teóricas, verdadeiros paradigmas que
foram sendo questionados e substituídos por outros. Talvez isso indique um
conhecimento sólido que se mantém vivo com o passar dos séculos de um lado e,
por outro, um conhecimento que ora acha que encontrou um terreno sólido para em
seguida trocá-lo por outro. E, além disso, passaram a existir as dicotomias
polêmicas tais como: racionalismo X empirismo; monismo X pluralismo,
materialismo X idealismo, entre outros. Os mesmos ensinamentos de Lao Tse,
Confúcio, Sidarta Gautama continuam os mesmos ainda hoje. Parmênides está
contido em Heráclito. P ⊂ H. Não restam dúvidas de que uma
ou várias ideias surgem com alternativos rótulos em momentos e lugares
diferentes. Projeto: inventariar tal fato. Futuramente talvez seja possível.
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