John Keats (1795-1821).
“Poeta cujo nome
estava escrito em água”
“Em Keats, o preciosismo e
a ornamentação de linguagem mescla-se à invenção verbal e à melissonância do
verso como dificilmente podemos encontrar em outro poeta inglês.” (Alberto
Marsicano e John Milton)
...
Hino à Tristeza (Excertos)
“Ó Tristeza,
Por que
tomas
A rubros lábios o matiz nativo da saúde?
Para
dar rubores de donzela
Às
moitas de roseiras brancas?
Ou tua mão de orvalho é a ponta das boninas?
“Ó
Tristeza,
Por que
tomas
Ao olho do falcão o ardor brilhante?
Para dar
luz ao vaga-lume
Ou, em
noite sem lua,
Tingir, em praias de sereia, a inquieta água do mar?
“Ó
Tristeza,
Por que
tomas
A uma plangente voz canções suaves?
Para
dá-las, na noite fresca,
Ao rouxinol
Que possas escutar entre os serenos frios?
“Ó
Tristeza,
Por que
tomas
À alegria de maio o júbilo do coração?
Nenhum
amante pisaria
A
primavera em sua fronte,
Dançasse embora desde a noite até o raiar do dia,
-
Nem flor alguma languescente,
Tida
por santa para o teu recesso,
Onde quer que ele folgue e se divirta.
”Ó
Tristeza
Eu
desejei bom-dia
E pensei deixá-la para trás, bem longe,
Mas
satisfeita, satisfeita,
Ela
quer-me ternamente;
É-me tão constante e tão amável:
Eu
queria enganá-la,
Assim deixando-a,
Mas ah! ela é-me tão constante e tão amável.
(...)
“Sob as minhas palmeiras e
do rio à margem
Eu
sentei-me a chorar: que noiva enamorada,
Se a
ilude um vago pretendente, ao vir das nuvens,
Não se oculta nem
se vela
Sob
escuras palmeiras e de um rio à margem?
(...)
”Vem pois, Tristeza!
Dulcíssima Tristeza! -
No
colo nino-te como se filha minha!
Eu
pensava deixar-te
E
te iludir,
Porém
no mundo inteiro és tu a quem mais quero agora.
(...).
Créditos: tumblr.com
...
COMENTÁRIO:
No mundo do pensamento e do
poder mental o poeta vê neblina e rocha. A neblina (mortalha de vapor) encobre
os abismos e o conhecimento do homem sobre o inferno, sobre o céu. Na medida em
que a neblina vai se espargindo revela-se a terra de forma vaga como o
conhecimento do homem sobre si mesmo. Sentindo as pedras ásperas sob seus pés
conclui que, o que ele (que se autodenomina “pobre e tolo elfo”) sabe é que
pisa sobre elas, e o que seus olhos vêm é somente neblina e rocha.Então, o pobre e tolo elfo
mira o abismo que se encontra encoberto por uma mortalha de vapor, para em
seguida estabelecer uma analogia entre o conhecimento do homem sobre o inferno e
o abismo. Ambos encontram-se encobertos pela mesma mortalha. Em seguida faz o
mesmo com o céu, para depois vislumbrar a terra, pisar suas pedras e concluir o
que ele vê no mundo do pensamento e do poder mental é somente neblina e rocha.
A neblina encobrindo o que
ainda não foi desvelado pela capacidade de conhecer do homem, e a rocha
representando o que de melhor essa capacidade produziu?
Musa, Abismo, Terra, Céu
aparecem também na Teogonia de Hesíodo: “Disso me narrem, Musas que têm morada
olímpica, do princípio, e dizei qual deles primeiro nasceu”. A resposta vem
logo a seguir: “Bem no início, Abismo nasceu; depois, Terra largo-peito, de
todos assento sempre estável, dos imortais que possuem o pico do Olimpo nevado,
o Tártaro brumoso no recesso da terra largas-rotas e Eros, que é o mais belo
entre os deuses imortais, o solta-membros, e de todos os deuses e todos os homens
subjuga, no peito, espírito e decisão refletida.”
Considerando outras
possíveis analogias ou mesmo coincidências, tais como no “Cimo do Ben Neves”
velado na névoa e pico do Olimpo nevado: no início o Abismo; na medida em que a
neblina que encobre o Céu vai se espargindo aparece a Terra; (Em Hesíodo o Céu
nasce de Terra: “Terra primeiro gerou, igual a ela, o estrelado Céu, a fim de
encobri-la por inteiro para ser, dos deuses venturosos, assento sempre
estável.”), é possível perguntar se ocorreu uma inspiração grega no poeta
inglês?A prece ou a lição que a
Musa lê para o poeta reza que névoa, vapor e neblina encobrem o conhecimento do
homem (pensamento e poder mental) sobre o inferno, sobre o céu, e sobre si
mesmo. Seria cético o poeta inglês? Tudo que ele vê é neblina e rocha nas
alturas em que se encontra no cimo do Bem Nevis, e também no mundo do
pensamento e do poder mental. Cético e realista? Ou será o oposto: acredita
somente no sonho que a vida é? Tudo ficando aquém da percepção humana em meio à
névoa, ao vapor e à neblina. A vida como um sopro de sonho.
...
COMENTÁRIO:
Em “No Mar” o som (canto
das ninfas do mar) e o movimento (calmaria e ventos celestiais) são
características ressaltadas na sua “visão-imagem” de mar: (eternos murmúrios;
velho e assombroso som; tão tranquilo; dias imóveis; desenlace dos ventos celestiais).
Mas, isso não é o que importa. Importa se situar nas invisíveis asas da poesia
para que elas se tornem visíveis, audíveis, sensitivas e por que não do sonho, que
venham de encontro com a nossa pele e nos faça arrepiar.Escutar as ninfas do mar
(quem está com os ouvidos atordoados
pelo ruído ou enfastiado da música melosa). Para tanto o poeta pede que
sentemo-nos à boca de uma das vinte mil cavernas inundadas pelo mar, em seguida
meditar até que seja possível escutar o canto das ninfas do mar.Quem cujos olhos estão atormentados e entediados
regozijai-vos com a imensidão do mar.
Da quase imobilidade de uma
enorme calmaria ao desenlace dos ventos celestiais: a alternância entre a
calmaria e o mar revolto pelos ventos celestiais. Em que céu estaria pensando o
poeta?
Até
que ocorra o sortilégio de Hécate (Deusa noturna,
da vida e da morte, chamada de “A Mais Amável”, “Rainha do Mundo dos Espíritos”,
“Deusa da Bruxaria”; a mais antiga forma grega da Deusa Tríplice, que
controlava o Paraíso, o Submundo e a Terra.) o mar guarda eternos
murmúrios nas praias desoladas e inunda, com suas soberbas cristas, vinte mil
cavernas, que passam então a abrigar o seu velho e assombroso som. O canto das
ninfas do mar?
Estar no mar é como ter ao
seu alcance o gozo do olhar a imensidão do mar, o prazer de poder escutar o
canto das ninfas do mar, que moram em uma das vinte mil cavernas inundadas pelos
murmúrios eternos do mar.O que se vê e o que se ouve
no mar.
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Comentário:
No poema “A Morte” o poeta
diz ser a vida nada mais que sonho, e pergunta se a morte (o que pensamos ser a
grande dor) pode ser sono. Ainda que o augúrio futuro do estranho vagar do
homem na Terra, em sua maldita vida, é somente despertar. Do sono ou do sonho?
Sendo a morte sono, resta o sonho. Despertar do sonho leva ao quê? Sendo a vida
sonho, uma vez dele desperto chega-se aonde, ao quê? Ou será que despertar do
sonho é cair no indesejado sono, na morte?
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