O verbo florescer em
Filosofia tem um sentido diferente de fazer surgir uma flor ou coisa parecida.
Em Filosofia quem surge é o Filósofo. Em determinado momento e em algum lugar
alguém floresce, atinge sua maturidade intelectual. Tornou-se Filósofo. Não o
Filósofo que tem um diploma e nada mais. Mas alguém que utiliza sua capacidade
de pensar para tratar das questões que historicamente passaram a ser
consideradas próprias ao Filósofo, e que começa a apresentar uma originalidade.
Interessante notar que Filósofo na verdade não é o Sábio, o que sabe, mas o que
é amigo do saber. Nem sempre estar em contato com o saber resulta em sabedoria.
Assim, temos que em dado momento da vida de alguém ocorre o florescimento, o
momento no qual começa a dizer o que ainda não foi dito. Começa a dar respostas
plausíveis sobre as questões filosóficas e, principalmente define que questão é
mesmo filosófica.
A questão filosófica com a
qual mais me preocupei na minha vida foi a de “como é possível o
conhecimento?”. Hoje não me ocupo muito
dela. Prefiro a ontologia em detrimento da epistemologia. Em Descartes, por
exemplo, hoje não mais me interesso pelo “Discurso do Método” e sim pelas “Meditações”.
No entanto, acredito que ainda se possa tentar dizer alguma coisa sobre essa
questão: como é possível conhecer? Aí fica difícil saber por onde começar.
Cronologicamente, talvez. Na verdade não importa muito por onde começar o
tecido argumentativo. O que importa é que relações serão engendradas, entre que
ideias e quais conceitos. Conhecer pode ser entendido de diversas formas. O que
interessa aqui é como a Filosofia e a Ciência produz novos conhecimentos que
passam a fazer parte da “enciclopédia” humana. Não há como não lembrar aqui da
questão do vínculo entre academia e poderes políticos e econômicos. Mas não vem
ao caso aqui, por isso a solução é abstrair tal fato.
Historicamente a lista dos
que contribuíram com ideias e propostas quanto às possibilidades do conhecer é
bem longa. Somente para um breve reconhecimento: Aristóteles, Bacon, Descartes,
Locke, Hume, Kant, Husserl, Popper, Merleau-Ponty, Kuhn, Feyerabend...
Método Filosófico versus
Método Científico: uma das questões. Feyerabend com seu “Contra o Método” negou
a existência de um método científico.
Concordo que definir Científico como o conhecimento que resultou da aplicação
do considerado método científico é um absurdo que continua sendo ensinado nas
melhores escolas do País, e o que é pior, inclusive nas de Ensino Superior.
Dizer que há uma diferença de método entre a faina do Filósofo e a do Cientista
não seria de certa forma, considerar que tipos de conhecimento diferentes para
serem produzidos, não podem prescindir de um caminho específico e
predeterminado a ser trilhado? Acredito que seja isto mesmo. Porém não posso
concordar com isso. Mesmo depois de, pelo menos, 2500 anos de discussões sobre
a questão, incluindo as contribuições clássicas e hodiernas ainda há quem
considera tal distinção válida, o que é algo, no mínimo, preocupante. Considero
válida para iniciantes e didaticamente para promover um avanço na compreensão
da questão, porém nada mais que isto. O que vai diferenciar a Filosofia da
Ciência na verdade não é a metodologia utilizada, mas sim a questão abordada,
ou o objeto de estudo. Como eu utilizo as ideias de Kant diferentemente na
Filosofia e na Ciência? Não dá. Seu método é um só: o crítico. Mesmo que ele
tenha, até certo ponto, tido a preocupação de separar o estudo do conhecimento
humano em Ciência (matemática – Estética Transcendental - e Física – Analítica
Transcendental) e Filosofia (Metafísica – Dialética Transcendental) Kant estava
na verdade preocupado com o conhecer em geral e, acredito que não lhe passou
pela cabeça estabelecer formas de conhecer que se aplicam a diferentes tipos de
conhecimento humano. A Teologia, por exemplo, teria que método próprio? A
questão em Kant é geral. Por isto é considerada filosófica. Acredito que alguém
por aí já deve estar se perguntando por que tanto abordar e falar de Kant. Em
minha opinião, tudo que veio depois de Kant pode ser agrupado em duas grandes
vertentes: a. desdobramentos do seu pensamento: “neokantismos” e, b) o que não
se coaduna com o seu pensamento, e que na maioria dos casos é como se fosse uma
fuga do que interessa para mergulhar em modismos passageiros. Por exemplo,
ficar preocupado com linguagem e adentrar-se pelos meandros do texto em si, como
uma língua de tamanduá no formigueiro, e deixar de lado o mundo é, em minha
opinião, no mínimo um contrasenso. Não estou dizendo que linguística não seja
uma preocupação importante. Claro que é. Mas é preciso dar a César o que é de
César. A língua e a linguagem nunca serão nada mais que formas específicas de expressão,
comunicação e memória. O que interessa para a Filosofia não é o texto escrito
ou falado em si. O texto serve para explicitar opiniões, ideias, conceitos,
etc. Nada mais que isto. O que deve ser objeto de preocupação do pensamento é o
mundo, a vida, o ser humano no mundo e suas opções de novos mundos, menos problemáticos,
menos injustos, menos cheio de mal. Considero que nem toda evolução ou dito
avanço é para melhor: acredito que o problema do conhecimento continua
assentado na relação consciência e realidade e não linguagem e realidade.
Hegel incluiu certo tempo
em Kant. Este é considerado a-histórico e daí em diante tudo é história. Tudo
bem que o resultado seja Marx, Engels, Feyerbard, URSS, e por aí vai... Fictche,
por exemplo valorizou a independência do eu. Uma questão não pode se calar
aqui: Kant refutou o idealismo material e ao mesmo tempo foi idealista e foi
base para o idealismo alemão, por exemplo, de Fichte, Schelling, Hege?
Penso que se alguém queira tentar realizar alguma coisa em filosofia deve conhecer, para começar a história da filosofia. Os frutos que resultaram da obra de Kant nos faz pensar que ela seja indispensável, mesmo fazendo parte da Filosofia Moderna. Para alguém que tenha a pretensão de conseguir realizar algo permanente na história das idéias filosóficas não pode prescindir de entender Kant. O que não é nada fácil. Quantos não o fizeram e floresceram? A lista pode se dizer que é
formada por toda a filosofia pós Kant de forma direta e indireta. No entanto,
alguns nos interessam sobremaneira: Nietzsche, shopenhauer e Heidegger diretamente,
kiekiegaard, Feuerbach e Marx via Hegel, por exemplo, são de certa forma neokantianos, não no sentido clássico
desta palavra ou conceito, como Herder, Rickert entre outros que contrapuseram a
compreensão à explicação na ciência, valorizando um antipositivismo, mas simplesmente
como frutos de uma árvore chamada Kant. Ficaríamos horas enumerando nomes aqui,
mas não é este o caso. O que interessa é que preciso entender que em Kant a
ontologia está integrada com a epistemologia. Na medida em que ele se propõe a
estabelecer os limites do conhecimento humano inclui em suas reflexões aquilo
que tal conhecimento pretende conhecer. Desta forma, ao estabelecer a conciliação
entre empirismo e racionalismo, não prescinde da sua aplicação aos idealismos
de Descartes e Berkeley, o que implica em abordar a questão do mundo material e
a comprovação de sua existência, ou seja, volta-se para a questão do Ser, para
a Ontologia. Kant se espantou com o fato de que depois de tantos séculos de
conhecimentos ninguém ainda havia provado de forma evidente que o mundo
material e exterior a cada um de nós seres humanos existe realmente. Refutou o
idealismo dogmático de Berkeley com sua Estética Transcendental e utilizou o
idealismo problemático de Descartes para concluir que “A simples consciência da
minha própria existência, embora empiricamente determinada, demonstra a
existência de objetos fora de mim no Espaço”. Eu diria que a questão não é de
crença na existência desse mundo material, mas muito mais de uma retórica na
qual se considera que algo tão óbvio precise ser provado. Todo o esforço de uma
vida não teria sido evitado se se tivesse pensado na época que tem coisas que
não se precisa provar, uma vez que é óbvia. Como não ter certeza de que na
minha frente agora não está um computador e que ele está fora de mim, é externo
a mim, posso sentir o seu calor de ficar ligado muito tempo, posso tocá-lo,
ligá-lo, não posso atravessá-lo com meu corpo, e por aí vai. Uma pessoa que tem
acesso apenas ao senso comum não perderia tempo com tal questão. Seria como
chover no molhado. Como não ter certeza de que existe um muro, uma parede aqui
na minha frente, feita de tijolos, argamassa etc.? Tudo bem que neles os
espaços vazios ocupam a maior parte de seu espaço. No entanto, trata-se de uma
diferença de intensidade de vibração. Como meus átomos estão em uma frequência
de vibração menor que as do muro eu não consigo atravessar meu corpo através
dele. Agora duvidar de que ele seja real é outra história. Tudo bem que se pode
dizer real, mas até quando? Porém isto não interessa aqui. Que os átomos que
hoje estão no muro e amanhã estarão em uma flor não nega que exista nem o muro
nem a flor. Se hoje eu vejo o muro e amanhã alguém vê a flor não significa que
não exista mundo exterior, pelo contrário confirma sua existência. Verificar se algo muda nas conclusões da Crítica da Razão Pura se se considera as descobertas da física quântica seria interessante, pois pode-se chegar à conclusão de que Kant provou a existência de algo que na verdade não existe: a matéria.
Filosofia da linguagem e
filosofia analítica que para mim são, de certo ponto de vista, a mesma coisa,
não tratam do que considero fundamental para a filosofia: a vida. O texto em si, como já me referi
anteriormente, não é um verdadeiro objeto de preocupação do filósofo, como eu o
concebo. Nem muito menos a lógica. Esta tem a mesma função da linguagem: contribuir
com o filosofar das questões filosóficas. O pragmatismo muito mais que o
neopragmatismo tem abordado algumas destas questões. Na mesma linha de pensamento pode-se chegar à mesma conclusão quanto à verdade. A verdade é uma questão que se insere no contexto da validade do conhecimento,
incluindo as implicações lógicas e tudo mais. Porém ela em si também não é uma
questão filosófica, por mais que muitos discordem de mim é o que eu penso. Se
não vejamos: discutir se existe verdade ou uma forma infalível de considerar
algo como verdadeiro é condição sine qua
non para que eu estabeleça opiniões relevantes sobre ontologia,
epistemologia, axiologia, por exemplo? Para mim não faz a menor falta uma
condição predefinida de verdadeiro versus falso nestes contextos. Não sei se me
faço entender?
O conhecimento é possível porque existe uma necessidade interna ao bípede sem penas e de unhas largas de superar seu espanto diante da realidade, da natureza, de Deus, e assim vai...
Mas isto não tem importância alguma. Acho que nesta prosopopeia
me superei no volume de palavreado sem sentido algum. Alguma relação com o
número sete e a conta de mentiroso?