sexta-feira, 19 de setembro de 2014

Prosopopéia XV



“A mulher é o alimento corporal o mais elevado.” (Novalis).

Pensamento ruim este! Por que imaginar situações que nos fazem sofrer? Amor a distância (AAD) perturba, principalmente quando impera (in) certo ciúme.  “Perdoa-me por me traíres.” Declaração de culpa: minha culpa, tão somente minha culpa! Por que a posse é tão importante? Que tipo de prazer é esse? Por que é difícil dividir? Na vida o dividir-nos entre os nossos, nem sempre é prazeroso e satisfatório para ambas as partes. Viajar, passear é melhor que trabalhar? Gostar mais de trabalho que de passeio é uma inversão de valores? Como saber? Difícil dizer o que vale o que os outros sentem. Por exemplo: “o que é belo é o homem dominando os traços femininos que estão nele, a mulher os traços masculinos” (Crítias). Há quem pense e aja justamente na contramão dessa máxima, e que cada um saiba de si, e de ninguém mais nessa questão. Mais condizente dizer algo que a nós se refere. Mesmo neste caso não é tarefa fácil. Expressar sentimentos e situações de nossas vidas de forma a realizar essa avaliação com alguma segurança de (in) certa certeza é proposta difícil de ser colocada em prática. “Falar não é ver. ‘O que de fato alguém viu, como é que pode exprimi-lo pela linguagem? ’” (Górgias). E de forma ainda mais contundente: “se fosse possível por meio das palavras dar a verdade dos fatos – pura e evidente –aos ouvidos, o juízo seria sem dificuldades...” (Górgias). Ou tudo isso não passa de uma grande bobagem, já que hoje em toda parte estão aí as redes sociais? Que linguagem é essa das redes sociais que mescla palavra, imagem, movimento, circulação e comunicação? Consegue negar essa máxima de Górgias? Mudou o status do ver? As redes sociais seriam uma reencarnação da Psicagogia, ou seja, “da arte de levar a alma, pela persuasão, até onde se quiser levar.” (Górgias) Banalizado está o instante vivido? Será isso uma forma de indecência?
Como funciona a indecência? Relaciona-se com o quê? Trair a pessoa amada é indecência? Ou não é possível amar e trair ao mesmo tempo? No amor não cabe o desamor? Esse não tem a menor chance de existir? Para existir desamor é preciso que exista antes o amor, já que o des esvazia algo que já existe; e na medida em que existindo amor não é possível o seu contrário, a única conclusão a que se pode chegar é que desamor é algo que só existiu em ideia, nunca realmente. O sexo que busca o prazer é indecência? A nudez é indecência? “Toda nudez será castigada.”!? Será por aí, ou responder sim para essas perguntas, ou mesmo tocar no assunto, é que é indecência?  Podemos pensar o mesmo em relação ao Ser e o não-Ser? “Se o ser é, o não ser é o não ser” - “De modo que as coisas não mais são do que não são.” (Górgias) Por que as formas básicas de se dar valor às coisas sempre geram divergências de opinião? Por que afinal uns gostam dos olhos e outros da remela e, talvez, de forma mais abrangente: que valores a maioria (ou valor é algo exclusivamente pessoal e intransferível?) considera indecência? Dá para concordar com ela? Precisamos da indecência? Para quê? Para que o nomos possa se sobrepor ao natural (Physis)? A lei é mais forte que a natureza e pode domá-la (Crítias), ou será o contrário (Hípias)? A indecência impede o prazer, ou o prazer deve suprimir a indecência? A lei não deveria justificar o prazer já que “a alma é essencialmente poder de sentir” (Crítias)?
Por que existe o medo da perda? Mesmo que as situações vividas indiquem paz, harmonia e prazer na relação, tal dúvida insiste. Por quê? Na balança dois valores:
a) viver a relação sem considerar a dúvida “dominando a sensação pelo pensamento” (Crítias)
b) viver os desdobramentos da dúvida sentindo a sensação sem considerar o pensamento.
Possível viver os dois alternadamente? Bem provável, mas vale a pena? Quem duvida desconfia! Desconfiar leva a vigília. Não acreditar em tudo que ouve da primeira vez procurando contradições no dito; vigiar onde o olhar se fixa, avaliando as reações que o fixado gera. Os olhos fixam-se no outro, gerando reações suspeitas de traição. Como seria aqui o tempo como momento oportuno do Helenismo? “Sentir o tempo como ocasiões favoráveis para a ação que vem a propósito, e não senti-lo como instantes iguais a qualquer outro”. Quais as condições favoráveis de agora? Qual a opção mais prazerosa? Vamos nessa... de qualquer forma ou não? Avaliando se a escolha é ou não justa ou nem pensar e nem se preocupar com isso? Justa com quem e em relação ao quê, afinal?

Então, para que imaginar que estão acontecendo situações que nos fazem sofrer? Ou será que elas são na verdade uma forma de prazer? Pode existir prazer na dor? Caso seja uma dor psicológica, passageira e restrita à imaginação, isso somado com a certeza de que o desprazer imaginado jamais se realizará, pode isso ser um prazer? Imaginar situações na relação que uma vez acontecendo nos magoe, e sabendo que não vão acontecer pode tornar os futuros encontros dos casais mais calientes? Masoquismo estético (Kierkegaard)?

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