terça-feira, 24 de julho de 2012
Dançar a vida! Até que ponto isto é possível e tem sentido? No prefácio do livro Maurice Béjart diz ser sinal dos tempos um filósofo e homem de ação, Roger Garaudy, se ocupar com os problemas da dança. Isadora Duncan, Martha Graham e Doris Humphrey estão incluídas na obra. Vale a pena ler e, principalmente retirar lições de cultura e de vida!
Ezra Pound: coletânea miúda.
SAUDAÇÃO
Ezra Pound
Oh geração
dos afetados consumados
E consumadamente
deslocados,
Tenho visto
pescadores em piqueniques ao sol,
Tenho-os
visto, com suas famílias mal-amanhadas,
Tenho visto
seus sorrisos transbordantes de dentes
E escutado
seus risos desengraçados.
E eu sou
mais feliz que vós,
E eles eram
mais felizes do que eu;
E os peixes
nada no lago
E não
possuem nem o que vestir.
(Tradução de
Mário Faustino)
(trecho de um comentário de Haroldo de Campos
extraído do livro: Ezra Pound - Poesia)
.
E ASSIM EM
NÍNIVE
Ezra Pound
“Sim, sou um
poeta e sobre a minha tumba
Donzelas hão
de espalhar pétalas de rosas
E os homens,
mirto, antes que a noite
Degole o dia
com a espada escura.
“Vê! Não
cabe a mim
Nem a ti
objetar,
Pois o
costume é antigo
E aqui em
Nínive já observei
Mais de um
cantor passar e ir habitar
O horto
sombrio onde ninguém perturba
Seu sono ou
canto.
E mais de um
cantou suas canções
Com mais
arte e mais alma do que eu;
E mais de um
agora sobrepassa
Com seu
laurel de flores
Minha beleza
combalida pelas ondas,
Mas eu sou
um poeta e sobre a minha tumba
Todos os
homens hão de espalhar pétalas de rosas
Antes que a
noite mate a luz
Com sua
espada azul.
“Não é,
Raana, que eu soe mais alto
Ou mais doce
que os outros. É que eu
Sou um
Poeta, e bebo vida
Como os
homens menores bebem vinho.”
Do livro:
POUND, E.
Antologia poética de Ezra Pound. Organização, apresentações e traduções por
CAMPOS, A.; CAMPOS, H.; FAUSTINO, M.; H; PIGNATARI, D.; GRÜNEWALD, J.L. Lisboa:
Ulisséia, 1968.
AND THUS IN NINEVEH
Ezra Pound
"Aye! I am a poet and upon my tomb
Shall maidens scatter rose leaves
And men myrtles, ere the night
Slays day with her dark sword.
"Lo! this thing is not mine
Nor thine to hinder,
For the custom is full old,
And here in Nineveh have I beheld
Many a singer pass and take his place
In those dim halls where no man troubleth
His sleep or song.
And many a one hath sung his songs
More craftily, more subtle-souled than I;
And many a one now doth surpass
My wave-worn beauty with his wind of flowers,
Yet am I poet, and upon my tomb
Shall all men scatter rose leaves
Ere the night slay light
With her blue sword.
"It is not, Raana, that my song rings highest
Or more sweet in tone than any, but that I
Am here a Poet, that doth drink of life
As lesser men drink wine."
O SOBRADO
Ezra Pound
[Tradução Lauro J.M. Marques]
Vem, apiedemo-nos daqueles que estão melhor que nós.
Vem, amiga minha, e recorda
.......que os ricos têm mordomos e não amigos,
E nós temos amigos e não mordomos.
Vem, apiedemo-nos de casados e solteiros.
A aurora entra com seus pezinhos
.......como uma dourada Pavlova
E estou próximo ao meu desejo.
Não há coisa melhor no mundo
Que essa hora de claro frescor
.......a hora de despertarmos juntos.
Ezra Pound
[Tradução Lauro J.M. Marques]
Vem, apiedemo-nos daqueles que estão melhor que nós.
Vem, amiga minha, e recorda
.......que os ricos têm mordomos e não amigos,
E nós temos amigos e não mordomos.
Vem, apiedemo-nos de casados e solteiros.
A aurora entra com seus pezinhos
.......como uma dourada Pavlova
E estou próximo ao meu desejo.
Não há coisa melhor no mundo
Que essa hora de claro frescor
.......a hora de despertarmos juntos.
Ezra Pound
¡Ciudad mía, mi amor, blanca mía! ¡ah, esbelta,
óyeme! Óyeme y un alma te infundirá mi soplo.
Suavemente en el caramillo, ¡escúchame!
Ciudad mía, mi amada,
eras una doncella todavía sin pechos,
esbelta como un caramillo de plata.
¡Ahora óyeme, escúchame¡
y un alma con mi soplo te daré.
Versión de Javier Calvo
COMUMENTE É ASSIM
Vladimir Maiakóvski
Vladimir Maiakóvski
“Cada um ao nascer
traz sua dose de amor,
mas os empregos,
o dinheiro,
tudo isso,
nos resseca o solo do coração.
Sobre o coração levamos o corpo,
sobre o corpo a camisa,
mas isto é pouco.
Alguém
imbecilmente
inventou os punhos
e sobre os peitos
fez correr o amido de engomar. Quando velhos se arrependem.
A mulher se pinta.
O homem faz ginástica
pelo sistema Muller.
Mas é tarde.
A pele enche-se de rugas.
O amor floresce,
floresce,
e depois desfolha.”
Fragmentos:
Vladimir Maiakovski
“...nenhum som me importa
afora o som do teu nome que eu adoro.
E não me lançarei no abismo,
e não beberei veneno,
e não poderei apertar na têmpora o gatilho.
Afora
o teu olhar
nenhuma lâmina me atrai com seu brilho.”
afora o som do teu nome que eu adoro.
E não me lançarei no abismo,
e não beberei veneno,
e não poderei apertar na têmpora o gatilho.
Afora
o teu olhar
nenhuma lâmina me atrai com seu brilho.”
“O coração tem domicílio no peito.
Comigo a anatomia ficou louca.
Sou todo coração.”
Comigo a anatomia ficou louca.
Sou todo coração.”
“Brilhar para sempre,
brilhar como um farol,
brilhar com brilho eterno,
gente é para brilhar,
que tudo mais vá para o inferno,
este é o meu slogan
e o do sol.”
brilhar como um farol,
brilhar com brilho eterno,
gente é para brilhar,
que tudo mais vá para o inferno,
este é o meu slogan
e o do sol.”
A Esperança
Vladimir Maiakovski
Injeta
sangue no meu coração, enche-me até o bordo das veias!
Mete-me
no crânio pensamentos!
Não
vivi até o fim o meu bocado terrestre ,
sobre
a terra
não
vivi o meu bocado de amor.
Eu
era gigante de porte, mas para que este tamanho?
Para
tal trabalho basta uma polegada.
Com
um toco de pena, eu rabiscava papel, num canto do quarto, encolhido, como um
par de óculos dobrado dentro do estojo.
Mas
tudo que quiserdes eu farei de graça:
esfregar,
lavar,
escovar,
flanar,
montar
guarda.
Posso,
se vos agradar, servir-vos de porteiro.
Há,
entre vós, bastante porteiros?
Eu
era um tipo alegre,
mas
que fazer da alegria,
quando
a dor é um rio sem vau?
Em
nossos dias,
se
os dentes vos mostrarem não é senão para vos morder ou dilacerar. O que quer
que aconteça,
nas
aflições,
pesar...
Chamai-me!
Um sujeito engraçado pode ser útil.
Eu
vos proporei charadas, hipérboles e alegorias, malabares dar-vos-ei em versos.
Eu
amei... mas é melhor não mexer nisso.
Te
sentes mal?
Não
acabarão nunca com o amor
Vladimir
Maiakovski
Não acabarão nunca com o amor,
nem as rusgas,
nem a distância.
Está provado,
pensado,
verificado.
Aqui levanto solene
minha estrofe de mil dedos
e faço juramento:
amo
firme,
fiel
e verdadeiramente.
E então,
que quereis?
Vladimir
Maiakovski
Fiz ranger as folhas de
jornal
abrindo-lhes as pálpebras piscantes.
E logo
de cada fronteira distante
ubiu um cheiro de pólvora
perseguindo-me até em casa.
Nestes últimos vinte anos
nada de novo há
no rugir das tempestades.
Não estamos alegres,
é certo, mas também por que razão
haveríamos de ficar tristes?
O mar da história é agitado.
As ameaças
e as guerras
havemos de atravessá-las,
rompê-las ao meio,
cortando-as
como uma quilha corta
as ondas.
segunda-feira, 23 de julho de 2012
sexta-feira, 20 de julho de 2012
Ao meu conterrâneo que temos em comum esta fonte autóctone de lições poéticas de vida (Emílio Guimarães Moura), que deveria ser visitada com muito maior frequência, para que possa ser saciada essa nossa premente e constante necessidade de aprender a viver!
LIBERTAÇÃO
Sou um poeta quase místico:
A vida é bela quando é um êxtase.
A vida é bela quando é um êxtase.
Ah! Não ter um pensamento, um só pensamento no
cérebro,
não vigiar a vida, a vida inquieta, a vida múltipla da sensualidade,
mas vivê-la, de olhos cerrados, num silêncio cheio de ritmos;
não ouvir as palavras frias que mudam o destino,
ou que o fazem semelhante a um autômato;
e saber a toda hora,
saber sempre,
que a vida é bela quando é um êxtase.
não vigiar a vida, a vida inquieta, a vida múltipla da sensualidade,
mas vivê-la, de olhos cerrados, num silêncio cheio de ritmos;
não ouvir as palavras frias que mudam o destino,
ou que o fazem semelhante a um autômato;
e saber a toda hora,
saber sempre,
que a vida é bela quando é um êxtase.
MEU CORAÇÃO
Penso agora nos mortos que não tem
nome,
nos vivos que não tem nome;
penso agora naqueles que vieram cedo demais e se cansaram,
e naqueles que chegaram depois que todas as portas já estavam fechadas.
Penso agora na sede do homem desesperado que se deixou ficar no deserto;
nos que lutaram inutilmente por caminhos que não levaram a nada;
nos que se calaram, porque compreenderam,
e nos que disseram todas as palavras e não foram compreendidos.
nos vivos que não tem nome;
penso agora naqueles que vieram cedo demais e se cansaram,
e naqueles que chegaram depois que todas as portas já estavam fechadas.
Penso agora na sede do homem desesperado que se deixou ficar no deserto;
nos que lutaram inutilmente por caminhos que não levaram a nada;
nos que se calaram, porque compreenderam,
e nos que disseram todas as palavras e não foram compreendidos.
Por que foi que, de repente,
todas as vidas se somaram
para me envolver neste momento?
Meu coração se multiplica:
agora é apenas meu coração que está palpitando no mundo.
todas as vidas se somaram
para me envolver neste momento?
Meu coração se multiplica:
agora é apenas meu coração que está palpitando no mundo.
TRÊS CAMINHOS
tantos caminhos andei.
O primeiro era de nácar,
de rosa pura o segundo.
O terceiro era de nuvem,
no terceiro te encontrei.
O primeiro já trazia
teu nome brilhando no ar.
Não era nome da terra:
cantava coisa do mar.
Logo senti que o segundo
já era estrada de encantar.
Mas, o terceiro, o terceiro
quantas voltas não foi dar!
Deixou meu corpo na terra,
Meu coração no alto mar.
Virou vento, virou bruma,
perdeu-se, rápido, no ar.
FOI INÚTIL
"Estás em tudo que penso,
Estás em quanto imagino."
Manuel Bandeira
Estás em quanto imagino."
Manuel Bandeira
Entre nós dois, que puseram?
O mar, o rio, a floresta?
Levantaram tanta pedra,
levantaram tanto muro,
gritaram tantas palavras...
O mar, o rio, a floresta?
Levantaram tanta pedra,
levantaram tanto muro,
gritaram tantas palavras...
Mas, de que foi que valeu?
Que foi que valeu tudo isso:
O mar, o rio, a floresta,
tanto muro, tanta pedra,
e tantas, tantas palavras,
se estás em tudo que penso,
se estás em quanto imagino?
O mar, o rio, a floresta,
tanto muro, tanta pedra,
e tantas, tantas palavras,
se estás em tudo que penso,
se estás em quanto imagino?
quinta-feira, 19 de julho de 2012
quarta-feira, 18 de julho de 2012
O arrasta pé do repe- rrepe que nem de música precisa.
O arrasta pé do repe-rrepe.
Próximo ao rancho, que ficava
perto do morro do “Chiquinho”, tinha a sede de uma fazenda cujo dono tinha
algumas filhas solteiras. Elas trabalhavam o dia todo na roça ficando avermelhadas
do sol e pretas do carvão. Um dia uma delas veio nos convidar para a “dança”
que ia ter lá na casa dela. Estávamos todos bem perto da fornalha, provando
alguma coisa e bebendo algo para esquentar um pouco e, é claro, com o
companheiro de sempre, o violão.
“Aqui nóis dança quase todo dia.
Sábado que vem vai ter dança lá em casa. Por que ocêis num vão também? Afinal
é aqui do lado, uai. Vai ser escurecendo...”.
O resto dos dias até o esperado
sábado não demorou muito a passar. Também a nossa tarefa estava bem pesada.
Precisávamos terminar o rancho o mais rápido possível para podermos passar para
o trabalho de preparar a terra e plantar o café. Já no sábado à tarde eu sempre
dava uma olhadela na direção da casa onde ia ter a dança para sentir a
movimentação.
Chegamos já escurecendo. O
horizonte estava avermelhado anunciando um friozinho. Apesar disto a noite
prometia ser agradável. O gravador de fita estava roncando mais que tocando a
música que era um animado forró. Ninguém estava incomodado com isso. A sala da
casa estava que não cabia mais ninguém. Alguns poucos mais tímidos estavam sentados,
a maioria, no entanto estava literalmente arrastando o pé no chão batido, que
exalava uma poeirinha quase invisível. A animação era contagiante. A ordem
geral era não parar de dançar. Não tendo cavalheiro vai dama. Não tendo dama
vai cavalheiro. Não tendo nenhum dos dois dança-se sozinho mesmo. De repente a
fita embucha no toca fita portátil. Um dos filhos do dono da casa corre com ele
para o quarto do lado da sala e começa a desmontá-lo. Logo só se vê um monte de
peças sobre a cama. Fui lá prá ver e desanimei. Tirar as peças do lugar é
fácil, difícil é encaixá-las de novo no lugar onde estavam. O “técnico” não
fazia a menor idéia de como fazer isso. O que ele sabia mesmo é que no canto
debaixo de uma das camas tinha um garrafão de pinga da boa, que o pai dele nem
sonhava que existia.
“Ôu’, pega uma lá prô cê... é da
boa. Fica vigiando aí ‘Ôu’, que o Pai não pode vê se não ele joga tudo fora,
uai! Pode pegá lá e põe uma prá mim tamém.”
A danada da pinga era boa mesmo. Na
sala estava todo mundo como encontramos na chegada – arrastando o pé e relando
o bucho. A música agora vinha do opala branco parado em frente da casa. O som
lá fora e o baile aqui dentro! De vez em quando se via alguém entrando meio
furtivamente no quarto aparentemente para olhar se o gravador tinha conserto.
Com certeza não tinha, no entanto, a cada momento aparecia um animado para dar
uma boa olhada nele. Isso foi boa parte da noite, até que o dono da casa
desconfiou daquele entra e sai no quarto onde jazia inerte um monte de peças do
tijolo Aiko, junto da sua capa de couro preta com a alça que permitia colocá-lo
a tira colo.
“Mais que negócio é esse que
ocêis num para de entrar nesse quarto? Consertando o gravador até agora? Tem música
já, afinal que que isso hem???”
Acabou de falar já entrando no
quarto e revirando embaixo das camas.
“Ahhhh! Eu sabia que era a danada
da marvada que num tem jeito mesmo! Ô Véia, vem vê o guardado aqui! (Essa
senhora era conhecida como Maria-rádio, pois começava a conversar com as
visitas desde que eles passavam pela porteira que dá acesso à varanda da frente
da casa. O único problema é que a porteira ficava a mais de 500 m, o que
impedia a possibilidade da conversa, mas isso para ela não era problema. Então
o que acontecia é que a conversa já estava bem adiantada quando na varada a
visita chegava. E também nada adiantaria se não estivesse, pois só ela é que
falava mesmo. Ela não dava nenhuma chance para alguém abrir a boca. Diante de qualquer
ameaça acelerava a prosa e aumentava o volume. Só parava quando a visita estava
de novo na porteira para ir embora. Será isso um tipo de doença?).
Mas, voltando para a “marvada” da
cachaça, o garrafão que estava pouco abaixo da metade estava prestes a chegar até
a pia da cozinha para ser completamente esvaziado. Três companheiros da turma
foram tentar salvar a embriaguês total da
pia da cozinha. Afinal era cerca de dois litros e meio. Conseguiram depois
de explicar que a pinga era de um deles e que ele prometia esconder no mato,
para levar para casa quando fosse embora.
“Então prá acabar com essa história dá
um jeito de escondê essa coisa lá fora no mato de jeito que só o Sinhô sabe
aonde tá, prá num dá pobrema, que eu já desacasuei com essa coisa que deixa
todo mundo doido de briga, sem sabê porquê... Inté otro dia o fato com as
tripas do Zeca foi liberado pela pexera do Quim. Esse tal no outro dia num
lembrava de nada e cedo passô na casa do seu companheiro de lida, o Zeca, e não
é que deparô com ele com as canela esticada de terno e já acomodado dentro do
madeirame.”
Mais do que depressa o garrafão foi
escondido numa moita perto da varanda da entrada da casa. Resolvido o problema
voltou todo mundo para o arrasta pé. E agora mais animado do que nunca. A
maioria já estava com o tanque cheio, sendo que alguns estavam prá trasbordar combustível. Mesmo assim, não demorou
muito e agora a oficina para consertar o gravador era na moita onde estava a “marvada”.
Só que agora não era mais oficina e sim mictório. Nunca se viu tanta vontade de
ir tirar a água do joelho naquelas
proximidades.
A fita que tocava no opala branco não
demorou muito começou a rodar cada vez mais devagar, alterando a rotação e
tornando a voz do cantor cada vez mais rouca e lenta... Até que parou de vez.
“É a bateria... vou ligar o carro e
logo tá resolvido”, falou animado a dar um jeito o dono do opala.
Quem disse que o danado do opala pegou.
A bateria tinha arriado de vez.
“Vamo empurrá que pega... é só virá e
embicá prá li ó, descendo o morro.”
Fizemos uma força danada concordando
com a ideia do dono do carro. Empurramos e soltamos morro abaixo.
“Vai, agora... vai sô. Põe segunda e
solta a embreagem e liga a chave...”
E quando a chave estava ligada e a
segunda engatada o opala já estava parado bem no final do morro que não era
muito longo. Não adiantava soltar. Agora é que levou a breca. O opala encalhado
no meio de dois morros: um que podia ser visto pelo parabrisas e o outro pelo
retrovisor.
“Vamu empurrá prá cima e soltá de novo...”
Gritou o dono do opala lá de baixo fazendo pose com o braço apoiado na janela
do motorista.
“Cê tá é brincando né? Já tô todo suado, oia
qui ó?” Reclamou um da turma que arrematou: “Nóis num dá conta de jeito nenhum
não...”
“E a junta de boi? Alguém vai buscá...”
Insistiu mais uma vez o motorista do opala.
“Cê tá é doido, home. Larga isso aí,
que amanhã a gente dá um jeito”.
O opala ficou no mesmo lugar
estatelando no sol por cerca de uma semana atrapalhando a passagem. Teve que
ser empurrado prá um lado prá abrir caminho, o que não foi suficiente. A enxada
teve que comer barranco para o leiteiro passar, mas mesmo assim não deu certo.
Por uns três dias o caminhão chegou até o opala e voltou de ré até a porteira
onde conseguia espaço suficiente para virar.
O fato é que quando entrei na sala
novamente custei a acreditar no que vi. O baile continuava sem música. Todo
mundo dançando no ritmo do som do repe-rrepe,
repe-rrepe dos pés no chão batido. Durante um bom tempo continuou assim.
Até que todo mundo foi se despedindo e indo embora mais ou menos ao mesmo
tempo.
“Vai tê dança amanhã?”
Perguntava um de cada vez quando ia se
despedindo. O dono da casa ficou cansado de dar a mesma resposta por várias
vezes.
“Não! Amanhã vai tê é reza. Tão tudo convidado. E se océis quizé
já pode ir adiantano e já poder trazê as prendas pru leilão de domingo que vem
na a Igreja de Nossa Senhora. Vai sê depois da missa...”.
Os moradores do Trêis Capão
naquela época estavam fazendo uma campanha para mudar o nome do povoado para
Senhora da Serra.
O horizonte avermelhado há muito tinha
dado passagem para uma lua quase cheia. Aos poucos os moradores daquele sertão
estavam todos bem acomodados debaixo das cobertas, repondo as energias para o
domingo que não demoraria a raiar. Ainda bem que ele permitia ficar mais um
pouco na cama pela manhã.
terça-feira, 17 de julho de 2012
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