"Trata-se de descrever, não de explicar nem de analisar" Maurice Merleau -Ponty (Prefácio da Fenomenologia da Percepção)
A narrativa e o sentimento do tempo. Heidegger,
Gadamer e Ricouer. O que poderia servir de justificativa para uma narrativa
expressar o sentimento de certo
tempo? Existiria uma tipificação social-geográfica para determinados
comportamentos, preconceitos e crenças num personagem humano hodierno? Que
traços característicos teria o brasileiro? Começar pelas diferenciações
regionais seria interessante na medida em que se pode perguntar o que fica e o
que permanece nesta tipologia humana, da mesma forma o que permanece na
mudança. Será que somente a língua, a religião (que vem mudando seu perfil), a
cultura (podemos reconhecer sem reservas a existência de UMA cultura
brasileira?), entre outros. Começaria dizendo que narrativa neste caso somente
teria sentido se fosse da própria vida de quem realiza a narrativa. Seguindo
Heidegger somos nós próprios os entes a ser objeto de análise. Narrar a análise
de si mesmo! Seria esta a justificativa para expressar o sentimento do tempo
que se está vivendo? Como enxergar o momento histórico no qual se está inserido
sem os vieses dos nossos preconceitos e crenças? Enxergar com os olhos dos
outros é possível? As respostas virão na medida em que seja dado início à
prática da narrativa. Que grau de realismo é possível? Casar o realismo com a
ficção talvez seja uma necessidade. Como ser um livro aberto hoje nas condições
reais de existência. Uma forma de preservar o privado da vida de quem está
realizando a narração. Por onde terá início tal casamento? Quem vem primeiro? O
real ou a ficção? Somente o narrador terá essa informação. E as pessoas com as
quais conviveu e com certeza conhecem diversas passagens da vida narrada terão
muitas dessas informações também, no entanto, nunca a totalidade dos momentos
narrados. Pensar na possibilidade de que outra pessoa alem do narrador possa
ter vivido todos os momentos de forma conjunta e concomitantemente por todos os
anos de vida narrados, seria no mínimo ilógico. No nascimento começa a vida,
mais do que óbvio. Seria esse o começo da narrativa? Machado de Assis uma vez
pelo menos começou do pós-morte no “Dom Casmurro”, se não me engano. Nesse caso
não é possível, pois o narrador deve narrar sua própria vida e para isso
necessariamente deve estar em condições de fazê-lo. A morte certa não pode
ainda ter dado as caras. Ainda há vida e, portanto a possibilidade de narrar o
que se sente no próprio tempo vivido. Que sentimentos podem aflorar?
Cansaço misturado com sono e um monte de ideias que não param de ulular dentro do cérebro. Devo ligar a
TV agora ou daqui a pouco? Será que já começou o programa que quero assistir. É
preciso levantar e ir até a TV para ligá-la. O teclado escraviza. Ah! Mas agora
eu ligo. Posso aproveitar para tomar uma água e esticar as pernas e quem sabe
olhar pela janela e ver o que acontece na praça em frente. Pelo que é possível
escutar parece que a praça começa a esvaziar-se. O silencio começa a predominar
sendo cortado apenas pelo barulho constante (ainda) dos escapamentos dos
veículos que passam em diversas direções.
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