Agora não resta nenhuma dúvida: vai ser prosopopeia de
verdade. Podemos pensar que Kant seja o inverso de Berkeley já que este negou a
realidade externa, e aquele provou sua existência. Importa ficar nos
preocupando se existe ou não o mundo e muito mais saber quais os limites do
nosso mundo? Um dos primeiros a propor uma divisão dual para o mundo foi com
certeza Platão: o mundo aparente e o mundo real. Nietzsche negou a existência
desses dois mundos para afirmar a vida e sugerindo que devemos parar de
procurar por um mundo que está além do nosso alcance. Eu prefiro também a ideia
de um único mundo, esse mundo no qual vivemos aqui e agora. Não estou dizendo
que Kant tenha cometido algum erro neste caso específico. Como não podemos
extrapolar os limites do mundo no qual vivemos o que nos impede de pensar que
na verdade o que existe mesmo é uma totalidade composta por essas duas partes
de forma integrada e unificada, num contexto complexo de fluxo de vida, no qual
nossos corpos interagem com o entorno. Eureka:
surpreendente mesmo é Edgar Allan Poe que pensava que essa totalidade, tudo que
existe, o universo é um grande poema escrito por Deus. Não é por acaso que já
se afirmou que “a imaginação dispõe de tudo!” Então imaginemos. Afinal são
prosopopeias. A respiração que circula entre o céu e a terra e da terra para o
céu, passando pelo lavar e banhar originando a possibilidade de aumento da
fronteira original conforme o misticismo oriental pode significar uma expansão
não só do tempo de vida, mas também da sua qualidade em termos de satisfação
dos próprios sonhos. A água que circula por entre todo o mundo vivo e inerte
com sua capacidade única de solvente universal pelos seus dois polos elétricos
contrários bem definidos também pode contribuir para isto. Os minerais que
estruturam o mundo todo, dos ossos às grandes cadeias de montanhas e fundos
oceânicos colaboram para o mesmo resultado? E assim por diante poderíamos
continuar verificando e questionando essas relações? Não há de um lado nossos
corpos e de outro o mundo exterior. Existe um mundo onde tudo e todos se
interagem. Talvez uma forma de holismo. Querer um status particular e
específico para nós seres humanos é aceitar a máxima de Protágoras de que o homem seja a medida de todas as coisas?
O fato aceito pelos geógrafos de uma maneira geral depois que Élisée Reclus publicou L'Hombre et la Terre afirmando que “o homem é a
natureza adquirindo consciência de si própria” implica necessariamente que podemos nos
considerar diferentes do resto do mundo vivo? Linguagem, ciência e tecnologia,
entre outros tantos, são diferenciais de peso nesta questão. Lao Tsé não teve
dúvidas quanto a isso e concluiu que os humanos são uma das dez mil
manifestações que formam o mundo e sem status especial. E você que está tendo a
paciência de ler toda essa prosopopeia o que acha o que pensa? Será que é
possível mesmo viver no fluxo do Tao sem perturbar seu equilíbrio harmonioso?
Que tal tentar?
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